Informativo de Jurisprudência do TCE/SC - N. - N. 065 Período - 01 a 31 de Outubro de 2019
Consulta. Servidor. Afastamento por decisão judicial. Continuidade do pagamento de remuneração.
O TCE/SC respondeu consulta formulada pelo Prefeito Municipal de Agronômica, acerca da possibilidade de realização de pagamento de vencimentos a servidores que, em razão de decisão judicial, encontram-se suspensos do exercício da função pública.
Inicialmente, o Relator especificou que a Consulta se refere à questão prática envolvendo dois servidores públicos do Município que foram afastados das funções e encontravam-se presos por suposto envolvimento na compra de votos e falsidade ideológica.
O Relator informou que, em decisão expedida por Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, foi determinada a soltura dos acusados, o afastamento das funções públicas no Município de Agronômica, sem, no entanto, dispor sobre a continuidade ou não do recebimento de seus respectivos vencimentos.
De acordo com o Relator, foi entendido por ele e pelo Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Junior, que “apesar de baseada em caso concreto, a controvérsia aludida envolve dúvidas sobre o ponto de vista do gasto público, mais especificamente se seria ou não devido o pagamento de remuneração a servidores afastados do exercício da função pública por decisão judicial. Mencionou, ainda, que a competência para análise da questão é deste Tribunal de Contas, por tratar de hipótese de ilegalidade de gasto público”.
O Relator destacou que “a presente Consulta versa sobre gasto público e possível dano ao erário, matérias que competem a este Tribunal, que por sua vez deve exercer seu papel no esclarecimento de dúvidas de administradores públicos no que tange a matérias de sua alçada. Considero cumprido, portanto, o requisito necessário para conhecimento do processo relativo ao art. 104, inciso I do Regimento Interno”.
Contudo, advertiu que “esta Decisão não representa prejulgamento de atos que porventura sejam praticados em decorrência da orientação ofertada por este Tribunal de Contas. A orientação ora ofertada tem como objetivo esclarecer a dúvida em seu sentido abstrato, isto é, se é devido o pagamento de remuneração a servidores públicos suspensos por ordem judicial do exercício da função pública”.
Quanto ao pagamento dos servidores afastados e sua possível suspensão, o Relator esclareceu que “Não há, em nosso ordenamento jurídico, dispositivo que defina que suspensões cautelares prejudicam a remuneração de servidor afastado do exercício da função pública. Neste sentido, prevê o art. 20, parágrafo único da Lei nº. 8.429/90”.
Da mesma forma, citou o artigo “Medidas cautelares pessoais diversas da prisão” de Carlos Henrique Borlido Haddad: “A interpretação autêntica aplicável ao direito penal não deve ser desprezada por se tratar de processo penal. Em se tratando de função pública, a suspensão determinada não pode importar em supressão de remuneração ou do auferimento de renda. Em primeiro lugar, porque não há determinação legal que imponha a cessação do pagamento de salário. Em segundo lugar, porque, devido à singeleza da regulamentação do CPP, deve-se recorrer a outras fontes para extrair a estrutura do instituto, e as normas integradoras não preveem a falta de remuneração”.
O Relator esclareceu que a suspensão determinada não pode importar em supressão de remuneração ou do auferimento de renda em caso de função pública e que este “posicionamento encontra escopo nos Princípios da Legalidade, do Devido Processo Legal e da Inocência. O Princípio da Legalidade, previsto no art. 37, caput da Constituição Cidadã, prevê que a Administração Pública está vinculada àquilo que prescreve a lei, estando seus atos limitados ao previsto na legislação. No presente caso, o art. 319 do Código de Processo Penal prevê tão somente a suspensão do exercício de função pública do servidor, deixando de versar sobre a suspensão de pagamento de remuneração. Não cabe, portanto, à Administração interpretar aquilo que a lei não prevê”.
O Relator afirmou que o entendimento do Supremo Tribunal Federal possui “jurisprudência dominante no sentido de que o pagamento da remuneração deve ser mantido nos casos de prisão: [...] O recurso deve ser provido, tendo em vista que a decisão proferida pelo Tribunal de origem contraria a jurisprudência desta Corte, uma vez que a suspensão de pagamento, na hipótese, é ilegal, em vista das referidas faltas ao serviço decorrentes da prisão cautelar, pois atenta contra o princípio da irredutibilidade dos vencimentos do servidor público, o qual, apenas depois de regular processo administrativo, no qual deve ser-lhe assegurada a ampla defesa, pode vir a ser privado de seus vencimentos, ainda que somente de uma parte de seu montante. [...] (ARE 1.058.492/SP. Rel. Min. Edson Fachin. DJe 09/10/2017)”
E ainda: “Servidores presos preventivamente. Descontos nos proventos. Ilegalidade. Precedentes. Pretendida limitação temporal dessa situação. Impossibilidade por constituir inovação recursal deduzida em momento inoportuno. 1. A jurisprudência da Corte fixou entendimento no sentido de que o fato de o servidor público estar preso preventivamente não legitima a Administração a proceder a descontos em seus proventos. 2. O reconhecimento da legalidade desse desconto, a partir do trânsito em julgado de eventual decisão condenatória futura, constitui inovação recursal deduzida em momento inoportuno. 3. Agravo regimental não provido. (AI 723.284 AgR/RS Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe 23/10/2013)”
Quanto ao caso de afastamento do servidor por indiciamento, o Relator estabeleceu que a remuneração é resguardada pela Lei nº. 9.613/1998, art. 17, modificada pela Lei nº. 12.683/2012, que define que “em caso de indiciamento de servidor público, este será afastado, sem prejuízo de remuneração e demais direitos previstos em lei, até que o juiz competente autorize, em decisão fundamentada, o seu retorno”.
Da mesma forma, citou o art. 147, da Lei nº. 8.112/1990: “Art. 147. Como medida cautelar e a fim de que o servidor não venha a influir na apuração da irregularidade, a autoridade instauradora do processo disciplinar poderá determinar o seu afastamento do exercício do cargo, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração”.
Desta feita, concluiu o Relator, que a suspensão do exercício da função pública não compromete o pagamento dos vencimentos do referido servidor enquanto não houver decisão final do processo judicial ou apuração em processo administrativo disciplinar.
“Assim sendo, não havendo determinação judicial sustando o pagamento da remuneração dos servidores, não pode a administração suspender o pagamento enquanto perdurar o afastamento determinado, com fulcro nos Princípios da Legalidade, da Presunção da Inocência e do Devido Processo Legal, previstos nos artigos 5º, incisos LIV e LVII, e 37, caput, da Constituição Federal de 1988”, complementou.
Extrai-se da ementa do voto do Relator: “O afastamento de servidor determinado por decisão judicial com base no art. 319, VI do Código de Processo Penal não acarreta suspensão do pagamento até decisão definitiva ou ordem judicial contrária”. @CON – 17/00036200. Relator Conselheiro Luiz Eduardo Cherem
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